terça-feira, 17 de abril de 2018

MENINO DIABO EM RIO PARDO


“(...) das façanhas do Menino Diabo apenas sobreviviam a fama da astúcia e a inverossimilhança do pitoresco, além da hediondez do exemplo.”
ANO DE 1836
Assumiu, então, o comando das ditas quilhas[1] um lusitano, que tinha adotado a divisa liberal e a nossa nacionalidade. Seu nome era Antônio Joaquim da Silva. Era de baixíssima estatura e na revolução exibiu artimanhas e ferocidades de um demônio. Daí o apelido que lhe deram de Menino Diabo.
Meteu a proa para Triunfo, o porto já indicado por Bento Gonçalves, com a finalidade de operar com uma força de cavalaria aí existente, sob as ordens de José Manuel de Leão. Não a encontrando, por ter sido dispersa, ante a aproximação do inimigo, subiu o rio Taquari, recolhendo-se à paróquia do mesmo nome, onde lhe foram dar caça. Nessa emergência, desembarcou tropa e artilharia, decidido a atuar em terra firme, como terrorista, seguindo o modelo dos mais autênticos subversivos. Agregando à sua força alguns elementos de cavalaria, organizou uma unidade, a que deu o nome de “Legião Diabólica”, da qual se constituiu o Comandante Superior ou o Quartel-Mestre, segundo os Apontamentos, de João Luiz Gomes.
Realizando a sua guerra particular, avançou direto a Rio Pardo, onde se apossa da localidade, a ferro e fogo. Saqueia tudo, como fizera, antes e depois, nas vizinhanças, Bento Manuel, a dar-se crédito aos ofícios de João Manuel e Neto.
Sua ação preocupou tanto ao governo legal que Bento Manuel mandou para ali a 3ª Brigada de Cavalaria, de Bagé, ao mando de Antônio de Medeiros Costa, em que servia, como subalterno, o futuro Marquês do Erval. A 11 de setembro, um dia depois da retumbante vitória farroupilha no Seival, o Menino Diabo é completamente batido no Passo do Couto (arroio tributário do Jacuí, porto e povoado), deixando no campo de batalha dois oficiais e 35 soldados mortos, 4 oficiais (3 dos quais feridos), 32 soldados e 10 escravos prisioneiros, além de 3 bandeiras, 3 bocas de fogo, 150 tiros de metralha, muitas clavinas[2], armas, espadas, pistolas e lanças, pólvora e munições.
Nesse combate sobressaiu-se, entre os legais, Osório, que, comandando o primeiro dos esquadrões de carga, a doze e meio passos da boca de um canhão farroupilha, lhe ‘rodou’ o cavalo e o cuspiu por terra, quando, ao seu redor, 9 praças eram atingidas pela metralha. Lépido salta sobre o primeiro animal que se lhe depara, sem sela nem freio. Manejando-o apenas pelo cabresto, de espada em punho, repõe-se à testa do esquadrão, arremetendo o inimigo, que é levado de roldão até a vila próxima.
Do Menino-Diabo ficaram muitas lendas, de imensas fortunas que ele teria escondido aqui e ali, nas suas retiradas. Em Rio Pardo até hoje há quem acredite que há dinheiro enterrado pelo Menino-Diabo no Barro Vermelho, no testemunho de De Paranhos Antunes. A mesma coisa no rio Taquari, acima da volta do Barreto, na ilha de Flores, outrora dos Macacos, onde ele refugiava o seu lanchão, quando se via acossado pelos inimigos.”

REFERÊNCIA: FAGUNDES, Morivalde Calvet. História da Revolução Farroupilha. 2. Ed; Caxias do Sul: Ed. da Universidade de Caxias do Sul; Porto Alegre: Martins Livreiro, 1985. p. 140-1, 240)


[1] 3 lanchões que, na ilha da Pintada, Porto Alegre, deveriam impedir os legais.
[2] Carabina usada por cavaleiro montado no século XVIII; espingarda curta.

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