COMERCIANTES NO VALE DO RIO PARDO
Os
comerciantes foram um segmento importante na formação da região,
contribuindo destacadamente no desenvolvimento inicial de Rio Pardo. A grande
maioria dos negociantes que se estabeleceu na Capitania do Rio Grande de São
Pedro do Sul durante a segunda metade do século XVIII e primeiras décadas do
século XIX era natural de Portugal, mais precisamente do Minho. Normalmente
esses homens de comércio estavam atrelados, por redes sociais e familiares, aos
comerciantes de grosso trato[1]
existentes no Rio de Janeiro. Interessados em expandir as suas atividades
comerciais para o Sul, os negociantes daquela praça promoveram o deslocamento
de caixeiros de suas relações e de outros seus protegidos para gerirem a
comercialização do trigo, couro e charque ou para administrar contratos de
arrematação da Coroa. Dentre esses, os mais bem sucedidos alçaram-se à condição
de correspondentes ou sócios dos seus antigos patrões.
Havia
um forte vínculo econômico e social que ES estabeleceu entre o Rio Grande do
Sul e o Rio de Janeiro. Era da corte, por exemplo, o local de onde provinham
constantes carregamentos de secos e molhados que eram revendidos em Rio Pardo.
O Rio de Janeiro era o principal ponto para onde convergiam os comerciantes
rio-pardenses, onde buscavam mercadorias e empréstimos para seus negócios.
Os
comerciantes estabelecidos nessa época na capitania, apesar de registrarem
índices de acumulação bastante inferiores aos dos seus homólogos do Rio de
Janeiro, foram identificados como sendo a elite econômica do Rio Grande do Sul
colonial (e não os estancieiros, como já se pensou). Foram ainda esses mesmos
negociantes que, na medida em que acumularam capitais, simultaneamente
procuravam diversificar seus negócios. Assim, alguns chegaram a possuir lojas,
barcos, produzir charque, emprestar dinheiro etc. Outros investiram parte de
seu capital na aquisição de estâncias de criação de gado e de fazendas de
produtos agrícolas.
Além
dos comerciantes de médio porte, surgiram também em Rio Pardo estabelecimentos
especializados na prestação de serviços, alguns dos quais de extrema relevância
para os carreteiros e tropeiros que passavam pelo local. Assim, o povoado
paulatinamente foi dando ocupação para alfaiates, barbeiros, ferreiros,
seleiros, sapateiros, ourives, boticários, açougueiros, taverneiros, padeiros,
casas de pasto e de rancho e mulheres de vida fácil.
Se
a localidade, até 1780, manteve uma vida essencialmente militar, a partir de
então passou a experimentar um surto de desenvolvimento econômico. Esse foi
proporcionado pela expansão da agricultura e da pecuária e, sobretudo, pelo
desenvolvimento da atividade mercantil, uma vez que Rio Pardo havia se tornado
um importante entreposto comercial. No final do século XVIII e início do XIX, a
povoação era uma das principais existentes na Capitania. Em 1809, graças ao
progresso material alcançado, a freguesia de Nossa Senhora do Rosário de Rio
Pardo foi elevada à categoria de sede municipal, como Rio Grande, Porto Alegre
e Santo Antônio da Patrulha.
O
povoado passou a destacar-se pela imensa atividade comercial que realizava.
Sendo fundamental o transporte fluvial para abastecer de secos e molhados o
entreposto, intensificavam-se as linhas de navegação que ligavam a vila com a
capital, através do rio Jacuí. Rio Pardo era um ponto central de chegada e
redistribuição de mercadorias. Suas casas comerciais eram ponto de partida das
tropas de mulas, comboios de carretas e tropas de gado que demandavam às
diferentes regiões da capitania. Como posto avançado de fronteira, a cidade
passou a atrair uma série de negócios, entre os quais: venda de escravos,
linhas de carretas, aluguéis de carretilhas e grandes armazéns que revendiam
para as bodegas ou bolichos da Campanha, Missões e Campos de Cima da Serra uma
série de produtos como sal, açúcar, vinho, aguardente, fumo, ferramentas,
velas, louças inglesas, tecidos, móveis e utensílios domésticos.
Porém,
apesar de lucrativo, o comércio era também perigoso e penoso. Para realizar as
atividades mercantis, era preciso o deslocamento das mercadorias. Numa época em
que os caminhos não passavam de trilhas e em que os rios eram vadeados nos
passos, o lombo da mula e as carretas eram os meios de transporte mais eficazes
para fazer chegar aos lugares mais distantes da fronteira os produtos
intermediados por Rio Pardo. As regiões de topografia acidentada eram percorridas
por tropas de mulas, que percorriam os antigos caminhos palmilhados
anteriormente pelos índios.
Em
1822 os principais produtos de exportação da província eram o trigo, couro cru
ou curtido de gado e de cavalo, charque, erva mate, sebo ou graxa, e o
principal mercado consumidor destas mercadorias era o Rio de Janeiro. Rio Pardo
era abastecida por Porto Alegre, de onde vinham tecidos e todos os produtos da
indústria européia, os víveres que a província não produzia, como vinhos, açúcar
e outros gêneros alimentícios que não eram produzidos no Rio Grande do
Sul. Ou seja: naquela época, em Rio
Pardo não havia produção agrícola suficiente para abastecer os habitantes da
vila, uma vez que o esforço produtivo era canalizado principalmente para a
criação extensiva de gado.
FONTE: VOGT, Olgário
Paulo. Formação social e econômica da porção meridional do vale do Rio Pardo. In:
VOGT, Olgário Paulo; SILVEIRA, Rogério Leandro Lima de (org.). Vale do Rio
Pardo: (re)conhecendo a região. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2001. P. 100-109.
[1] “(...) empreendedores mais capitalizados que, por
estarem envolvidos em atividades muito lucrativas como o tráfico internacional
de escravos, o abastecimento interno e as finanças colônias” eram assim
denominados. (VOGT, p. 101)
Nenhum comentário:
Postar um comentário