quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

BARÃO DE SANTO ÂNGELO (1)


Manuel de Araújo – que ao apelido de família acrescentaria, mais tarde, o nome Porto Alegre – nasceu no município de Rio Pardo, em 29 de novembro de 1806. Era filho legítimo do português Francisco José de Araújo, negociante, aqui na província, de fazendas e trigo, e de Francisca Antônia Vianna, nascida em Viamão.
Aos cinco anos perde o pai. Sua mãe, precisada de apoio moral e material, torna a casar-se. José Teixeira de Macedo, padrasto do pequeno Manuel, certo de seus deveres, manda, sem perda de tempo, instruir o enteado. Este corresponde mostrando diligência nos estudos. Uma única vez gazeia. Falta à escola para apreciar a ornamentação da cidade, que a Câmara de Porto Alegre mandara levar a efeito, com o fim de comemorar o nascimento do Príncipe da Beira.
Está o menino com nada mais de doze anos, morre-lhe o padrasto. Ao atingir os 16 – concluídos os estudos mais necessários – passa a interessar-se pelo ofício de relojoeiro. Mas não é sua vocação. A natureza, com seus motivos pitorescos e pinturescos, e a pintura exercem enorme fascínio sobre sua alma de adolescente. Informando-se em livros rudimentares e apreciando os artistas que surgem na província, vai se iniciando, primária, deficientissimamente na matéria de seu gosto.
Por tal ocasião, toma o primeiro contato com a cenografia. Num teatrinho particular, onde também representa, começa a trabalhar em cenários. Aflige-se por não atinar com a maneira de dar profundidade às cenas, representar as coisas ao longe e por desconhecer outros pequenos segredos do “métier”. Persistente, curioso, chega, afinal, ao domínio completo das leis da perspectiva e projeção.
Por esta época tem conhecimento da existência da “Missão Artística Francesa”, que atua no Rio de Janeiro. Deseja muito ver a coisa de perto. Falta-lhe, porém, ânimo para abandonar a mãe viúva, em busca de conveniência sua.
Acontece-lhe, entretanto, um incidente que lhe traria um novo rumo à vida. Lembra-se o jovem Manuel – isto lá por 1826 – de organizar um concurso para saber qual a moça mais feia da cidade de Porto Alegre. Ele próprio dá seu voto à filha de um figurão da terra. Queixa-se o pai insultado ao governador. Este pretende castigar o atrevido e faz com que o incluam na lista dos recrutados para os Dragões de Rio Pardo. Com mais boa sorte que juízo, encontra-se o jovem desmiolado com o Visconde de Castro, irmão da Marquesa de Santos, homem de elevada influência política, para cujo prestígio apela. Ordena, sem demora, o poderoso senhor a baixa do recruta.
A atmosfera hostil, entretanto, poderia permanecer. Por tal motivo, parte o rapaz para o Rio. Conhece e se faz aluno de Jean Baptiste Debret (1768 – 1848), discípulo do famoso Jacques Louis David (1748 – 1825), pintor predileto de Napoleão Bonaparte. Cria-se logo uma amizade, que o tempo solidificaria, entre Debret e Araújo.
Em 1829, em nome de seu mestre, consegue Porto Alegre uma licença de José Clemente Pereira para uma exposição pública da Academia de Belas Artes. Nesta, expõe, também, o rio-pardense, que é triplicemente premiado: pintura, arquitetura e escultura.
Mas não se limita o nosso homem ao aprimoramento nas artes. Frequenta os primeiros anos da Escola Militar, estuda filosofia, anatomia e fisiologia. Inteligência ativa e interessada em setores múltiplos do conhecimento humano, poderíamos chama-lo de um pequeno Leonardo.
Acha-se, por esta altura, otimamente relacionado. É amigo dos bispos do Rio de Janeiro, Diamantina e Maranhão, dos irmãos Andrada, de Evaristo da Veiga e até de Sua Majestade Imperial, cujo retrato pinta. Promete-lhe o monarca leva-lo à Europa, onde o fará conhecer membros de sua família e lhe facilitará novos estudos. Com o “7 de Abril”, porém, desfazem-se os sonhos. Araújo não esquece, contudo, as considerações recebidas de Sua Majestade. Assim é que em homenagem ao primeiro Pedro, mantém-se fiel ao segundo.
A sonhada visita ao Velho Mundo há de lhe ser proporcionada por Debret. Em julho de 1831, acompanhado do francês, parte para a Europa. Em Paris, recebe aulas do Barão de Gross. Entre altos e baixos de seus recursos financeiros, excursiona por onde pode, levando sempre que pode, seu amigo Gonçalves de Magalhães. Com ele e Torres Homem, funda a revista “Niterói”. Faz conhecimento com diversas figuras de alto conceito no cenário da cultura europeia. Mantém proveitosa amizade com o enorme Visconde de Almeida Garret.


REFERÊNCIA: Catálogo e Programa das Comemorações do Sesquicentenário do Nascimento                        de MANUEL DE ARAUJO PORTO ALEGRE BARÃO DE SANTO ÂNGELO), com notas biográficas de José Julio Barros. Porto Alegre/Rio Pardo, novembro de 1956.

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