domingo, 26 de janeiro de 2020

BARÃO DE SANTO ÂNGELO (final)


Em 1837, torna ao Rio. É nomeado professor da Academia de Belas Artes. Em 1838, no dia 14 de outubro, desposa Ana Paulina Delamare, de quem terá oito filhos. O terceiro a nascer, a menina Carlota, tornar-se-ia esposa de Pedro Américo de Figueiredo, pintor de fama, prosador e poeta.
Aproxima-se de João Caetano, cujos antiquados cenários atualiza, para quem traduz inúmeras peças e presta mais obséquios, em troca de ingratidões.
Em 1848, desgostoso com a Academia, pede o nomeiem como substituto da cadeira de desenho da Escola Militar. Nos lazeres desta ocupação começa a compor o seu “Colombo”.
Urbanista – virtude sua que não se faz conhecida do povo ledor – revela-se hábil. Insta com a Câmara Municipal do Rio de Janeiro no sentido de fazer levantar a carta geral da cidade, elabora projetos inteligentes para melhorar, embelezar e sanear a capital brasileira.
Em 1854 é nomeado Porto Alegre para dirigir a Academia de Belas Artes. Três anos passados, porém, entra em desentendimentos e deixa o cargo.
Em 1859 é nomeado nosso cônsul em Berlim, de onde requer, em 1867, transferência para o Consulado de Lisboa. Em 1847, ainda como nosso representante junto ao governo português, é agraciado com o título de Barão de Santo Ângelo.
Em 1876 presta um belo serviço à cultura brasileira: obtém da Torre do Tombo preciosa cópia da “Carta de Pero Vaz de Caminha” e a envia à Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.
Em 1877 sucedem-lhe dois ataques de congestão cerebral, que o deixam paralítico e sem fala. Muito não há de resistir o velho Barão. No dia 29 de dezembro de 1879, em seu Consulado de Lisboa, exala o último suspiro.
Em maio de 1922, passados quase 43 anos de sua morte, são repatriados seus restos mortais. Ao seu torrão natal, porém – que é Rio Pardo – só em 1930, se não nos falham as informações, é que chega, para o definitivo repouso, o corpo embalsamado do grande brasileiro. De sua autoria nos ficaram muitíssimos trabalhos, quer de artes plásticas, quer de arte literária.
Como pintor, aproveitou motivos históricos, utilizou passagens da Paixão de Cristo, fez o próprio retrato e o de amigos e protetores, incluindo-se D. Pedro I. Seu grande painel da “Coroação”, infelizmente inacabado, é tido como obra preciosíssima.
Em arquitetura, urbanismo, escultura e cenografia, sua contribuição é menos numerosa, mas nunca desprezível.
No que se prende às letras, fundou revistas, deixou trabalhos vários nas páginas da Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, fez traduções, escreveu peças de teatro, duas óperas líricas e poesia. Deixou-nos, ainda, notas auto-biográficas, em que se baseiam seus biógrafos.
De seus dramas e comédias, há os que se perderam. Chegaram até nós: Angélica e Firmino (1845), Estátua Amazônica (1848), Os Voluntários da Pátria (1877), O Prestígio da Lei (1859), Os Judas (1858), Os Lobisomens (1863), A Escrava (1863).
Em poesia, pode-se resumir sua obra em Brasilianas (1863) e Colombo (1866).
Foi membro da Academia Brasileira de Letras, ocupada depois por Ramiz Galvão, também rio-pardense, e por Viriato Correia.

REFERÊNCIA: Catálogo e Programa das Comemorações do Sesquicentenário do Nascimento de MANUEL DE ARAUJO PORTO ALEGRE BARÃO DE SANTO ÂNGELO), com notas biográficas de José Julio Barros. Porto Alegre/Rio Pardo, novembro de 1956.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

PINACOTECA ALDO LOCATELLI PRESTA HOMENAGEM AO BARÃO DE SANTO ÂNGELO

Pinacoteca Aldo Locatelli, museu instalado no Paço dos Açorianos, abrirá exposição em alusão aos 140 anos da morte de um dos mais importantes artistas brasileiros do século XIX, Manuel de Araújo Porto-Alegre (1806 – 1879), o Barão de Santo Ângelo. A mostra O Barão no Paço inaugura nesta quinta (23/1/2020), às 18h30min, com entrada franca.
Reunindo desenhos e pinturas originais de diversas coleções sediadas em Porto Alegre, a exposição retoma a trajetória de um gaúcho que teve atuação fundamental no desenvolvimento das artes plásticas e da literatura no Brasil imperial.
Paulo Gomes, curador da mostra, apresenta a exposição: "Manuel de Araújo Porto-Alegre (1806 – 1879), o Barão de Santo Ângelo, nasceu no Rio Grande do Sul e, muito jovem, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde fez carreira como escritor, político, jornalista, pintor, caricaturista, arquiteto, crítico e historiador da arte, professor e diplomata. O historiador Max Fleiuss chamou-o de ‘homem tudo’, uma definição precisa para essa personalidade multiforme.  Sua reduzida presença no panorama da cultura sul-rio-grandense no século XIX levou Guilhermino Cesar a escrever que ‘Se houve um gaúcho ausente dos quadros locais [...], esse parece ter sido Manuel de Araújo Porto Alegre’. Hoje a sua presença na terra natal é basicamente post mortem: túmulo, rua, monumento, nome de instituição e um rarefeito número de obras."
A exposição permanece aberta para visitação do público até 13 de março, com entrada franca.






quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

BARÃO DE SANTO ÂNGELO (1)


Manuel de Araújo – que ao apelido de família acrescentaria, mais tarde, o nome Porto Alegre – nasceu no município de Rio Pardo, em 29 de novembro de 1806. Era filho legítimo do português Francisco José de Araújo, negociante, aqui na província, de fazendas e trigo, e de Francisca Antônia Vianna, nascida em Viamão.
Aos cinco anos perde o pai. Sua mãe, precisada de apoio moral e material, torna a casar-se. José Teixeira de Macedo, padrasto do pequeno Manuel, certo de seus deveres, manda, sem perda de tempo, instruir o enteado. Este corresponde mostrando diligência nos estudos. Uma única vez gazeia. Falta à escola para apreciar a ornamentação da cidade, que a Câmara de Porto Alegre mandara levar a efeito, com o fim de comemorar o nascimento do Príncipe da Beira.
Está o menino com nada mais de doze anos, morre-lhe o padrasto. Ao atingir os 16 – concluídos os estudos mais necessários – passa a interessar-se pelo ofício de relojoeiro. Mas não é sua vocação. A natureza, com seus motivos pitorescos e pinturescos, e a pintura exercem enorme fascínio sobre sua alma de adolescente. Informando-se em livros rudimentares e apreciando os artistas que surgem na província, vai se iniciando, primária, deficientissimamente na matéria de seu gosto.
Por tal ocasião, toma o primeiro contato com a cenografia. Num teatrinho particular, onde também representa, começa a trabalhar em cenários. Aflige-se por não atinar com a maneira de dar profundidade às cenas, representar as coisas ao longe e por desconhecer outros pequenos segredos do “métier”. Persistente, curioso, chega, afinal, ao domínio completo das leis da perspectiva e projeção.
Por esta época tem conhecimento da existência da “Missão Artística Francesa”, que atua no Rio de Janeiro. Deseja muito ver a coisa de perto. Falta-lhe, porém, ânimo para abandonar a mãe viúva, em busca de conveniência sua.
Acontece-lhe, entretanto, um incidente que lhe traria um novo rumo à vida. Lembra-se o jovem Manuel – isto lá por 1826 – de organizar um concurso para saber qual a moça mais feia da cidade de Porto Alegre. Ele próprio dá seu voto à filha de um figurão da terra. Queixa-se o pai insultado ao governador. Este pretende castigar o atrevido e faz com que o incluam na lista dos recrutados para os Dragões de Rio Pardo. Com mais boa sorte que juízo, encontra-se o jovem desmiolado com o Visconde de Castro, irmão da Marquesa de Santos, homem de elevada influência política, para cujo prestígio apela. Ordena, sem demora, o poderoso senhor a baixa do recruta.
A atmosfera hostil, entretanto, poderia permanecer. Por tal motivo, parte o rapaz para o Rio. Conhece e se faz aluno de Jean Baptiste Debret (1768 – 1848), discípulo do famoso Jacques Louis David (1748 – 1825), pintor predileto de Napoleão Bonaparte. Cria-se logo uma amizade, que o tempo solidificaria, entre Debret e Araújo.
Em 1829, em nome de seu mestre, consegue Porto Alegre uma licença de José Clemente Pereira para uma exposição pública da Academia de Belas Artes. Nesta, expõe, também, o rio-pardense, que é triplicemente premiado: pintura, arquitetura e escultura.
Mas não se limita o nosso homem ao aprimoramento nas artes. Frequenta os primeiros anos da Escola Militar, estuda filosofia, anatomia e fisiologia. Inteligência ativa e interessada em setores múltiplos do conhecimento humano, poderíamos chama-lo de um pequeno Leonardo.
Acha-se, por esta altura, otimamente relacionado. É amigo dos bispos do Rio de Janeiro, Diamantina e Maranhão, dos irmãos Andrada, de Evaristo da Veiga e até de Sua Majestade Imperial, cujo retrato pinta. Promete-lhe o monarca leva-lo à Europa, onde o fará conhecer membros de sua família e lhe facilitará novos estudos. Com o “7 de Abril”, porém, desfazem-se os sonhos. Araújo não esquece, contudo, as considerações recebidas de Sua Majestade. Assim é que em homenagem ao primeiro Pedro, mantém-se fiel ao segundo.
A sonhada visita ao Velho Mundo há de lhe ser proporcionada por Debret. Em julho de 1831, acompanhado do francês, parte para a Europa. Em Paris, recebe aulas do Barão de Gross. Entre altos e baixos de seus recursos financeiros, excursiona por onde pode, levando sempre que pode, seu amigo Gonçalves de Magalhães. Com ele e Torres Homem, funda a revista “Niterói”. Faz conhecimento com diversas figuras de alto conceito no cenário da cultura europeia. Mantém proveitosa amizade com o enorme Visconde de Almeida Garret.


REFERÊNCIA: Catálogo e Programa das Comemorações do Sesquicentenário do Nascimento                        de MANUEL DE ARAUJO PORTO ALEGRE BARÃO DE SANTO ÂNGELO), com notas biográficas de José Julio Barros. Porto Alegre/Rio Pardo, novembro de 1956.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

INCÊNDIO DO TEATRO APOLO


 INCÊNDIO Devorado pelas chamas o antigo edifício do Cinema Apolo
Pavoroso incêndio destruiu na madrugada de 26 do corrente o prédio onde, por muitos anos funcionou o antigo Cine Teatro Apolo.
Há muitos anos deixara o velho casarão da Rua Almirante Alexandrino de ser utilizado como casa de diversões. Não mais ecoavam em seu teto as manifestações alegres dos (frequentadores?) do velho teatro de Procópio Ferreira, nem se ouviam as calorosas palmas das entusiastas assistências. Abandonado por muitos anos, à riste sorte das cousas imprestáveis, dele se lembraram um dia, quando um novo surto de progresso vem animar a nossa terra. Arrancaram-no de sua solidão, não para ser convertido em um novo teatro, mas sim e lamentavelmente transformado em secador de arroz.
Hoje se vingaram os estranhos fados de inglório destino dado ao Teatro.
Ei-lo reduzido a cinzas.
D E T A L H E S
Aproximadamente às 4h da madrugada de 26 de junho um clarão iluminou os céus de Rio Pardo.
Algumas pessoas que se preparavam para os trabalhos do dia, procuraram ver a origem da estranha aparição. E logo se espalhou célere a notícia: “Incendiou o Apolo.” Grande massa afluiu ao local enquanto sinos repicavam em sinal de alarme.
Inutilmente tentaram as inúmeras pessoas debelar o fogo. O velho casarão fora construído de boa madeira, que resiste ao tempo, mas não suporta as chamas.
Durante muitas horas as chamas continuaram sua faina destruidora.
Os antigos risos das sessões teatrais transformaram-se em crepitação de madeira.
APENAS O ARROZ NO SEGURO
Fomos informados de que, a não ser o arroz depositado, nada mais estava segurado, sendo avultados os prejuízos sofridos pelo Sr. Homero Schultze.”

REFERÊNCIA
Jornal de Rio Pardo, Domingo, 29/6/1952 – Ano II – nº 86, p. 01.
Encadernação Jornal Rio Pardo – 1952-1953, Arquivo Histórico Municipal de Rio Pardo
Pesquisa da Profª Neuza Quadros, 29/11/1993

sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

RIO PARDO EM 1835 (Início da Revolução Farroupilha)



Por ser um dos principais centros do Rio Grande do Sul na época da Revolução Farroupilha Rio Pardo foi bastante atingida. Uma estatística de 1814 mostrava que Rio Pardo era a vila mais populosa da Província, com 10.445 habitantes, enquanto Porto Alegre tinha 6.111 e Rio Grande 3.590 habitantes.
Em 1835 Rio Pardo acolhia em sua sociedade a elite do povo rio-grandense e suas ruas viviam cheias do mais intenso movimento como entreposto que era entre a capital e as localidades da fronteira.
No Jacuí navios, lanchas e chatas, num vai-vem contínuo, carregavam e descarregavam, e carretas tiradas a seis, oito juntas de bois, partiam para diversos pontos da fronteira atulhadas de fazendas, gêneros e mercadorias de menor valor. Era, por assim dizer, o centro comercial do Rio Grande.
Centro de tanta importância, não podia permanecer impassível aos azares da política, e liberais e caramurus[1] enfrentavam-se sem tréguas. Da parte dos liberais destacavam-se a família dos Amarais, e como líderes dos caramurus sobressaía José Joaquim de Andrade Neves (mais tarde Barão do Triunfo).
O programa do partido liberal era sustentar a revolução de 7 de abril que depôs D. Pedro I; de manter a constituição jurada em 1824 e efetuar as reformas necessárias nas instituições com  prudência e patriotismo. Já o partido caramuru era conservador e não escondia os seus desejos de promover a volta de D. Pedro I ao Brasil. O primeiro fundou no Rio a Sociedade Defensora da Independência, que teve quatro filiais no Rio Grande do Sul, em Rio Grande, Pelotas, Jaguarão e Rio Pardo.
Em 1831 começaram a surgir os sucessos trágicos de que foi cenário a vila de Rio Pardo na Revolução Farroupilha. Os liberais de Rio Pardo reuniram-se e criaram a sua Sociedade Defensora, com bases maçônicas, inaugurada em 7 de abril de 1835, presidida por um dos membros da família Amaral.
Pouco antes, nos dias 28, 29 e 30 de janeiro de 1835, tinham-se dado violentas escaramuças nas ruas da vila, tal a exaltação dos ânimos. Em virtude desses distúrbios, prosseguia um processo contra os liberais por perturbação da ordem pública. O juiz deste caso foi assassinado por um grupo de mascarados que pretendia roubar os autos do processo.
Fatos como esses aconteciam por toda a Província, até que em 20 de setembro de 1835 Bento Gonçalves expulsou o presidente Fernandes Braga, que fugiu para Rio Grande deixando a capital em poder dos revolucionários.
Alguns dias depois o General Andrade Neves, liderando seus correligionários, levantou-se em Rio Pardo, tentando subjugar os rebelados. Os liberais rio-pardenses, advertidos a tempo, saíram da vila, efetuando o seu cerco. Foram socorridos por reforço de duzentos guardas nacionais vindos de Cachoeira e cercaram os caramurus no Passo do Couto, na várzea do rio Pardo e na margem direita do Jacuí. Assim estiveram alguns dias as duas forças se defrontando, até que                Bento Gonçalves interferiu entre os adversários, e os caramurus capitularam.
REFERÊNCIA:
ANTUNES, de Paranhos. História de Rio Pardo – Subsídio para a história do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Livraria do Globo, 1933. p. 24-30.


[1] CARAMURUS (Restauradores): conservadores, queriam retorno D. Pedro I e regime monárquico centralizado. Formado por
comerciantes portugueses, burocratas  e militares.
   LIBERAIS (Chimangos): moderados, não queriam um regime absolutista, mas sim capaz de defender interesses np sim um  s capitularam. (elite agro-exportadora (elite nacional)
Aristocracia centro-sul; Farroupilhas: exaltados, mais autonomia para província; pequenos comerciantes e homens livres de posses, os mais extremados queriam República