VILA DE RIO
PARDO, 3 DE MAIO DE 1821 – O couro e o trigo são os principais
gêneros que os negociantes desta vila exportam; e é do Rio de Janeiro
diretamente que importam quase todas as suas mercadorias.
Nos
arredores da cidade, cultivam muito trigo, principalmente nas paróquias da
Encruzilhada e de Taquari. Como, aliás, em toda parte, queixam-se muito da
ferrugem, mas recentemente introduziram-se na região duas variedades de trigo,
chamadas trigo-branco e trigo-moro, menos sujeitas a essa doença que a espécie
comum, à qual se dá o nome de trigo-crioulo, por ser a mais antiga.
Disseram-me
que aqui havia duas plantas muito prejudiciais às plantações de trigo, nascendo
no meio delas e sufocando-as; uma, denominada joio, e que segundo me
informaram, deve ser uma gramínea; a outra, chamada cálamo, não é outra coisa
senão a aveia comum. Esta é de tal modo difícil de destruir que, mesmo depois
de se ter deixado crescer o mato num terreno outrora de trigo, cortada e
queimada, feita nova cultura com sementes puras, a aveia ai reaparece em
abundância.
VILA DE RIO
PARDO, 4 DE MAIO DE 1821 – Faço diariamente excursões, mas não encontro
quase nenhuma flor; muitas árvores das matas já perderam suas folhas; as que
ainda conservam são as de folhas duras, de um verde escuro e brilhante, tais
como as mirtáceas. Desde que estou aqui, o tempo se mantém magnífico e
asseguram-me que todos os anos, por esta época, há alguns dias de bom tempo. É
o que se chama verãozinho de maio, veranico de maio.
VILA DE RIO
PARDO, 18 DE MAIO – A Vila de Rio Pardo é inteiramente nova. Todos os que
aqui vieram estabelecer-se há menos de trinta anos, contam-me que, na época, só
se viam aí palhoças. No início se fixaram juízes regulares; depois trocados por
um juiz-de-fora. Esta cidade, também sede de uma paróquia, está situada em
terreno muito acidentado, à confluência do rio que lhe dá o nome e à do Jacuí.
A rua
principal se prolonga sobre o cimo de uma colina bastante elevada, as demais se
estendem nos flancos dessa e de colinas adjacentes. A maioria dessas últimas
ruas se intercomunicam diretamente; são, por assim dizer, grupos de casas
jogadas aqui e ali, entremeadas de relvados, terrenos baldios e de cercados com
plantações de laranjeiras, conjunto ao mesmo tempo variado e agradável à vista.
Pequena, a praça pública. A igreja paroquial forma um dos seus lados, não está
completamente pronta, o mesmo acontecendo às outras duas igrejinhas também
desta cidade. A casa da Câmara, da qual a prisão faz parte, é um edifício
térreo.
A rua
principal se encontra, parcialmente, pavimentada; a maior parte das outras
ainda não. As casas de Rio Pardo são telhadas, algumas grandes e bem
construídas; delas conta-se grande número de um e mesmo de dois andares, e
quase todas que denunciam certa riqueza possuem sacadas de vidro.
É na rua
principal que se vê a maior parte das lojas e armazéns de comestíveis, uns e
outros igualmente bem sortidos. Embora Rio Pardo seja uma cidade rica e
comercial, nenhuma providência foi tomada até agora para facilitar o
desembarque das mercadorias que aqui chegam. Não se pensou ainda em fazer
declives à margem do rio, e a rua de acesso ao porto não é pavimentada, além de
muito íngreme e mal conservada.
As
embarcações que servem ao transporte de mercadorias entre Porto Alegre e Rio
Pardo são chamadas propriamente de canoas que, no Brasil, significa piroga; são
pontudas, possuem um mastro, em torno de cinquenta e cinco a setenta palmos de
comprimento e até vinte de largura. Delas nunca há mais de dez ao mesmo tempo
no porto de Rio Pardo, mas em geral gastam poucos dias para carregar e
descarregar.
REFERÊNCIA
SAINT-HILAIRE, Auguste de. Viagem ao Rio Grande do Sul.
Porto Alegre: Martins Livreiro Editora, 1997. p. 362-364.
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