A Comissão encarregada por esta Câmara para
a visita das Prisões Civil e Militares por circulares de 19 do corrente mês,
abrange em seu pensar ter cumprido com o determinado no Artigo 56 da Lei de 1º
de outubro de 1828; e declara que destinou o dia vinte e um para seus
trabalhos, e os concluiu.
Sendo que chegasse à Prisão Militar, se lhe
apresentou antes de penetrá-la um edifício arruinadíssimo, e que se tornará
úmido nos dias chuvosos pelo mau estado de seu telhado. Este edifício,
Senhores, estava inabitado, talvez por este motivo; mas à Comissão consta
haverem militares sentenciados como abaixo exporá: a sua escuridão é imensa,
porque simplesmente tem uma pequena janela na frente, podendo pelo menos
admitir duas, e mais rasgadas, a fim mesmo de que melhor se areje , e sua
pequenez será insuficiente para mais de vinte homens se ali os houver: tem de
comprimento quarenta palmos, e de largura trinta e oito; sendo admissível o
podê-la prolongar mais. Uma tarimba arruinada é o leito dos desgraçados, e
parte desta já não existe; porém um bom concerto suprirá o dissabor com que a mesma Comissão
olhou para um edifício nacional, que a se não reparar promete maior estrago, e
que de certo passará ao Quartel obra tão útil, como necessária nesta Fronteira.
Passando à Prisão do Hospital Regimental a viu com bom agrado, e
transportando-se logo a de correção no Quartel aonde existe a Tropa, a viu com
mágoa situada no vão de uma escada, não tendo mais de largura que cinco palmos.
E será ali, Senhores, aonde se corrige os defensores da Pátria!!! A Comissão
ainda o duvida! E não será difícil no verão suportar-se um tão pequeno
estreito? Não será isto castigo sobre castigo, já havendo-se dissipado o tempo
férreo? A Comissão tem julgado a forma de melhorar-se esta Prisão, e é, que uma
parede de paus a pique que a separa de um dos lances dos Armazéns Nacionais do
extinto Almoxarifado, pode-se muito bem derrubar, e com diminuta despesa ficar
decente. Daqui, Senhores, foi a Comissão ao sobradinho do mesmo Quartel, que
serve de prisão aos Oficiais Militares, e achou-se somente o telhado arruinado,
paredes, parte do assoalho e forro; porém dirigindo-se a mesma, aos presos
sentenciados a trabalhar, os viu, e lhes inquiriu sobre o seu passadio, eles
certificaram ser bom, e igual a qualquer outra praça do Corpo que estivesse
gozando da sua liberdade.
A Comissão deixando as Prisões Militares,
passou à Civil; porém que pasmo! Que horror!!! E que repugnância de olfato!
Entrou, e viu um Cárcere de vinte e sete palmos de comprido, e vinte e cinco de
largo com vinte e um presos, sendo as paredes centrais de pau a pique, e já
lhes caindo o reboco. Que alegria, Senhores, conheceu-se na fisionomia dos
encarcerados com a inesperada visita” Porém, o quanto eles se alegraram, a
Comissão sucumbiu com o pestífero hálito, e a vista da nudez que sofriam
aqueles infelizes; e alguns com mais de ano de prisão, assim como Jacinto
Hipólito, Manoel escravo de Francisco da Costa Maya, e Manoel escravo de
Antonio Cardoso há dois anos, todos com pesadíssimos grilhões, e outros que se
não ousa aqui declarar com meses de prisão, inteligenciando à Comissão, que
suportavam ferros por falta de segurança da mesma Prisão; e que em muitos dias
se lhes relavam as entranhas pela fome; e o que só os punha (às vezes) salvo
disto, eram as escassas esmolas que das janelas agenciam de pessoas que
transitam pela frente do mesmo Cárcere.
Esta Prisão, Senhores, está falta de
recursos para persistirem os desgraçados. Constituição e Filantropia ainda não
apareceram aos presos da Cadeia de Justiça.
Esta Câmara movida de patriotismo, e
humanidade deverá por termo aos flagelos destes infelizes. Ora, o local desta
Prisão, é numa Rua, e a mais pública desta Vila, onde infesta com asqueroso
hálito a vizinhança pela falta de comodidades para limpeza; mas sendo que por
falta de meios (o que a Comissão não aprova) não se possa removê-la à lugar onde
seja bem arejada, e com comodidades adjacentes para sua limpeza, e despejos;
então se poderá estender até a extremidade inferior da Casa, ficando com duas
janelas na frente, duas no fundo e sendo admissível da parte do corredor do
portão aonde favorece o nordeste romper outras duas, então será algum tanto
ventilada; e assim ficam extintas as trevas de dois pequenos, e estreitinhos
corredores horrorosos que se chamam – Segredos -: martírio este tão indecoroso,
como impróprio de um Povo livre. A mesma Casa que foi construído de princípio
para habitação de família, desmanchando-se paredes, a Comissão a julga com
cômodos para prisão; porém reparou ela não ter uma sala ainda mesmo
insuficiente para presos de pouca monta, ou de correção, vendo até um indivíduo
que na noite antecedente tinha sido preso policialmente, junto aos criminosos
agrilhoados. Ali, Senhores, também se viu dois escravos deitados em cima de pedras
quase aguda que ladrilham a prisão, e debaixo da tarimba, surrados cruelmente,
e por isso enfermos; e não será desumanidade em um País liberal, ver o rigor
com que se castiga um homem que só tem o defeito, ou infortúnio de ser cativo?
Serão eles menos sensitivos aos demais homens? Passada que fosse a Comissão ao
Cárcere das mulheres, aonde existia uma preta fugida que exercitava as funções
naturais no próprio assoalho da prisão, como se observou; e atribuiu-se falta
de humanidade o não se por um vaso próprio para tais desenvolvimentos.
Senhores, a reforma que a Comissão julga
nesta Prisão, é em tudo: ela nada mais conhece tão digno de atenção, bem que
saiba que a beneficência é uma arte muito difícil; porém não no Brasil nossa
Pátria.
O orgulho que a mesma Pátria tem abatido, e
que sempre foi um dos principais móveis da crueldade, deprimindo o quanto se
deve aos homens, está hoje dissipado.
Conhecida agora a filantropia que
caracteriza os Ilustres Membros desta Câmara, espera a Comissão ver remediados
os males, e as misérias que atenuam a humanidade encarcerada. Este, Senhores, é
dever sagrado; e do contrário para que será preciso informações tais, e de
objetos que causam tanta dor, se não procura instantaneamente derrubar ou
melhorar o mal, que os torna prejudicialmente?
Rio Pardo, 24 de janeiro de 1832.
(Assinaturas: Ricardo Antonio de Melo, José
Ferreira Gomes Filho, Perseverando Rodrigues Ferreira, Zeferino Rodrigues
Ferreira, José Antonio Gonçalves)
REFERÊNCIA:
Transcrição com
grafia atualizada de documento do Livro nº 22 – 1832 – p. 74 – 76v, do acerco do Arquivo Histórico Municipal de
Rio Pardo