sexta-feira, 27 de novembro de 2015

TRATADO DE MADRI (2)

                Cada Coroa escolheu dois comissários para efetuar as demarcações, dois para as regiões ao norte e “Portugal nomeou para comissário do Sul o capitão-general do Rio de Janeiro, Minas e São Paulo, Gomes Freire de Andrade, mais tarde conde de Bobadela;  (...). A Espanha designou o marquês de Valdelírios (...). Ao serviço de cada um desses quatro indivíduos foi posta uma comissão de geógrafos e astrônomos, grande número dos quais contratado no estrangeiro.”
                O artigo 16 do Tratado determinava: “Das povoações ou aldeias que cede Sua Majestade Católica na margem oriental do Uruguai, sairão os missionários com todos os móveis e efeitos, levando consigo os índios para aldear em outras terras de Espanha; e os referidos índios poderão levar também todos os seus bens móveis e semoventes, e as armas, pólvora e munições que tiverem; em cuja forma se entregarão as povoações à Coroa de Portugal, com todas as suas casas, igrejas e edifícios, e a propriedade e posse do terreno.”
                Gomes Freire e Valdelírios encontraram-se para sua primeira conferência no campo de Castilhos Grande (1º de setembro de 1752). Prosseguiram as demarcações até à altura dos Sete Povos (julho de 1753). Próximo a Bagé, se depararam com um grave problema: índios armados recusavam-se a abandonar seus territórios. O resultado foi a Guerra Guaranítica. No primeiro semestre de 1756, quando espanhóis e portugueses unidos venceram os índios, a situação ficou clara: os índios não sairiam pacificamente e os portugueses não entregariam Sacramento em troca de área que tivessem ainda que conquistar. O resultado foi a anulação do Tratado de Madri e o retorno à situação de conflito entre as Coroas Ibéricas no sul do Brasil.


(PEDROSO, Antônio de Souza. O Brasil na administração pombalina: economia e política externa. 
2. ed. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1979. (Brasiliana, V. 192). p. 105-111.)

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

TRATADO DE MADRI (1)

                Tratado de limites pelo qual Portugal e Espanha “fixavam os respectivos domínios na Ásia e estabeleciam fronteiras para os da América.” Até então vigorara o Tratado de Tordesilhas, que dividira o mundo entre as coroas ibéricas e na época de sua assinatura (1494) a demarcação feita “fora a única possível na primeira hora”, mas não era a mais adequada na prática, pois não “correspondia mais aos respectivos interesses”.
                “O Tratado de 1750 revogava todas as estipulações anteriores sobre a sua matéria, estabelecia o princípio do uti possidetis: ‘cada parte há de ficar com o que atualmente possui’; visava limitar o Brasil por rios, montanhas, em suma, por fronteiras quanto possível naturais. (...) Estipulavam essencialmente os diversos artigos deste documento que a bacia do Prata ficava pertencendo à Espanha, enquanto a do Amazonas permanecia com Portugal. Do lado do Brasil a fronteira devia buscar em linha reta os cumes dos montes, cujas vertentes descessem por uma parte para o oeste, que corre ao norte do regato, no pé do monte de Castilho Grande, ou para a Lagoa Mirim ; e pela outra parte para a costa, que corre do mesmo regato ao sul, ou para o rio da Prata, de sorte que as cumeeiras dos montes servissem de raia dos domínios das duas coroas. Todas as vertentes que descessem para a Lagoa Mirim, ou para o Rio Grande de São Pedro, ficavam para Portugal; e para a Espanha, as que baixassem aos rios tributários do Prata (...).
                A partilha dos rios foi objeto de grande cuidado. À falta de estradas e dos transportes modernos, constituíam as vias de comunicação por excelência. Acordou-se que a sua navegação seria comum no caso das duas potências possuírem estabelecimentos ribeirinhos; seria exclusiva quando ambas as margens pertencessem à mesma nacionalidade.
                Dos dois rios principais, Amazonas e Prata, o primeiro era pertença nossa, o outro tocaria aos castelhanos. Para que lhes ficasse a navegação exclusiva do Prata pactuou-se uma troca de territórios. Dar-nos-iam os Sete Povos das Missões, situados na margem esquerda do rio Uruguai (...). Nós dar-lhe-íamos a Colônia do Sacramento, que possuíamos na margem esquerda do rio da Prata.
                No tratado há dois objetivos atinentes, é certo, ao mesmo fim. O primeiro é o levantamento duma linha de fronteira. O segundo é uma troca de territórios.”
                Tanto portugueses quanto espanhóis, nas suas Cortes, protestaram quanto à troca de territórios. Os espanhóis temiam pelas minas de Potosi, próximas às Missões; já os portugueses protestavam pois para eles a “Colônia de Sacramento era um porto de imensa importância comercial e estratégica. Sob qualquer dos aspectos superior a Buenos Aires”, mesmo sendo o território das Missões bem maior. Porém, a Colônia era dispendiosa para o Governo Português, constantemente atacada pelos espanhóis: valia a pena a troca.
                O Tratado foi ratificado por Portugal em 26 de janeiro de 1750 e pela Espanha em 8 de fevereiro de 1750. Porém, vários atos diplomáticos posteriores, necessários à sua execução, retardaram sua execução, que só de daria a partir do início de 1752.


(PEDROSO, Antônio de Souza. O Brasil na administração pombalina: economia e política externa. 2. ed. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1979. (Brasiliana, V. 192). P. 105-111.)

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

APROPRIAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DO TERRITÓRIO NA FRONTEIRA GAÚCHA

“              A disputa pela apropriação do espaço no Extremo-Sul entre portugueses e espanhóis, ao longo dos séculos XVII e XVIII, é bem evidente no avanço e recuo das Missões jesuíticas na alta bacia do rio Uruguai, onde estas implantaram-se como verdadeiro ‘quisto’ entre os territórios controlados pelas duas coroas. Aos poucos a luta se expandiu para as áreas de Pampa, ‘terras de ninguém’, rumo ao estratégico estuário do Prata, verdadeira sentinela geopolítica onde, ainda em 1680, fora estabelecida pelos portugueses a Colônia de Sacramento (...).
                Apesar de terem se expandido por todo o espaço conhecido hoje como Campanha Gaúcha, de Bagé a Rio Pardo, de São Vicente a São Borja, as missões jesuíticas do século XVII foram devastadas com a caça ao índio promovida pelos bandeirantes paulistas e abandonadas em definitivo com a expulsão dos jesuítas dos territórios luso-castelhanos na metade do século XVIII. Apenas em 1801, a região noroeste do atual Rio Grande do Sul seria definitivamente incorporada.
                O verdadeiro ‘deserto’ de dunas e campinas na costa entre Laguna e o Prata retardou a fixação humana na região hoje compreendida pelo Rio Grande do Sul. No interior, à exceção do gado chimarrão (selvagem) deixado à solta após a expulsão dos jesuítas pelos bandeirantes, e dos índios, tomados como escravos, nenhum interesse econômico relevante incentivava a ocupação. Além disso, o próprio clima não era apropriado aos cultivos tropicais que interessavam à economia mercantil européia. Essas condições naturais levariam à constituição de uma verdadeira fronteira aberta em meio às campinas do Pampa, domínio dos índios charruas e minuanos, hábeis cavaleiros caçadores que, apesar de dizimados, legaram importante herança à cultura gaúcha.
                A propósito da herança indígena, é importante lembrar que mesmo nas sociedades primitivas já se delineava uma divisão territorial do trabalho, intimamente relacionada ao meio natural: enquanto nas áreas de mata ao norte e centro do atual estado as etnias Gê (guaianás e caingangues) e tape (depois guaranizados) praticavam a agricultura, na atual faixa fronteiriça de Rio Grande a  São Borja, dominava a caça pelos cavaleiros da nação chaná (minuanos e charruas). É bastante provável que tenha raízes aí o mito, ainda hoje pregado por alguns estancieiros, de que somente as áreas de mata seriam favoráveis ao uso agrícola do solo.
                O vaivém da linha fronteiriça e os freqüentes conflitos armados reforçaram o caráter militar da sociedade gaúcha. Muitos núcleos eram criados e abandonados em curtos espaços de tempo, e outros conseguiam definitivamente se instalar com base em sua condição estratégico-militar: Santa Maria, por exemplo, surgiu de um acampamento militar demarcados de limites (1787-1801), Bagé surgiu com o forte espanhol de Santa Teclar (1773) e Alegrete de um acampamento português (1811).
                Além da conotação tradicional com que a denominação Campanha é reconhecida, não se deve descartar também um significado militar, já que os comandos da governadoria militar do ‘ Continente de São Pedro’, com sedes em Rio Grande e Rio Pardo, eram denominados, no início do século XIX, Comandos de Fronteira ou de Campanha.
                A criação de um forte em Rio Grande (1737), único abrigo portuário no longo e inóspito litoral entre Santa Catarina e o Prata, levou à formação daquele que se tornaria, já no início do século XIX, o centro polarizador da economia e de expansão do povoamento na área da Campanha, que até então se identificava com o próprio espaço da Capitania.”


(COSTA, Rogério Haesbaert da. Latifúndio e identidade regional. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1988. (Série Documenta, 25) 

domingo, 15 de novembro de 2015

A BARCA LIBERAL
                Na edição de 1903 do Almanak Litterario e Estatístico do Rio Grande do Sul, o historiador Alfredo Ferreira Rodrigues, organizador e editor dessa histórica publicação, relata, sob o título “Homens e Fatos do Passado”, a viagem inaugural da “Barca Liberal”,  primeiro barco a vapor a sulcar as águas interiores do Estado.
                Ferreira Rodrigues inicia o texto com a tradução de referência que lera, ainda jovem, num livro do inglês Willian Scully: “Esta província (Rio Grande do Sul) foi a primeira do império que utilizou as vantagens da navegação a vapor. Os empreendedores habitantes de Pelotas, em 1834, fizeram correr uma barca de vapor entre essa cidade e a de São Pedro.” E corrige a informação: “O fato é verdadeiro no que diz respeito ao Rio Grande. Não o é tratando-se do Brasil em geral, pois que, já em 4 de outubro de 1819, o general Felisberto Caldeira Brandt, depois Marquês de Barbacena, inaugurara um pequeno vapor entre a Bahia e Cachoeira. Além disso, há um engano de datas, tendo a barca começado a navegar em 1832 e não em 1834.
                Deveu a província esse progresso a quatro homens empreendedores: Domingos José de Almeida, Antônio José Gonçalves, José Vieira Viana e Bernardino José Marques Canarim, que constituíram uma sociedade por ações, mandando vir dos Estados Unidos uma máquina a vapor para mover a barca, que se estava construindo em Pelotas, nos estaleiros do arroio Santa Bárbara.
                Domingos José de Almeida adiantou, sem juro algum, o dinheiro preciso para ultimar-se o negócio, pois que por fim os outros acionistas abandonaram a empresa.
                A barca, que recebeu o nome de Liberal, desceu do estaleiro em meados de setembro de 1832, fazendo experiência no dia 30 no São Gonçalo, com grande admiração dos espectadores pela velocidade com que rompeu contra o vento e grande correnteza de água.
                As suas viagens começaram a 7 de outubro. O “Noticiador”, do Rio Grande, no dia 11 publicou a seguinte descrição da primeira delas: ‘No dia 7 do corrente, pelas 8 horas da manhã, saiu daquela vila (Pelotas) a barca, conduzindo muitos generosos cidadãos que quiseram ter o gosto de serem os primeiros flutívagos argonautas (...). Às 11 horas já se achava na vila de São José do Norte (...). Ao confrontar com o primeiro edifício desta vila, todas as embarcações e iates içaram a um tempo suas bandeiras, flâmulas e galhardetes e um considerável número de foguetes, subiram imediatamente ao ar (...) . As janelas estavam ocupadas por senhoras e as praias atulhadas de povo, que, com acenos de lenços, gritos e vivas e continuação de fogos, fazia uma bela vista e não punha em dúvida o entusiasmo de que todos estavam possuídos (...). Depois de ancorada a barca unida ao trapiche, desembarcaram muitos passageiros e outros cidadãos subiram à dita barca, cada um com a sua notável curiosidade e interesse, examinando-a atentamente, por ser bem de supor que alguns dos observadores não tivessem visto uma embarcação semelhante. Às 2 horas da tarde partiu, levando talvez mais passageiros que conduzira.
                Não deve passar sem reparo a celeridade, naquela época, fora do comum, da barca, que fez a viagem de Pelotas a São José do Norte em menos de 3 horas. O êxito desta primeira viagem animou os proprietários da barca a mandarem-na, em princípios de novembro a Porto Alegre. Ali se demorou algum tempo, fazendo diversas excursões ao Rio Pardo, vila do Triunfo e colônia de São Leopoldo. Na viagem ao Triunfo, levou mais de 150 passageiros, o que prova não só as suas vastas acomodações, como a predileção do público por esse novo modelo de locomoção. O lucro realizado por essa excursão foi calculado por um jornal da capital em muito mais de dois contos de réis.
                De volta a Pelotas, iniciou carreira regular entre essa vila e o Rio Grande, com escalas pela barra do arroio Pelotas e São José do Norte. De julho de 1833 em diante, as saídas de pelotas foram fixadas em todas as segundas e quartas-feiras, regressando do Rio Grande nas terças e quintas, fazendo excepcionalmente uma ou outra viagem a Porto Alegre.
                Em 1836, foi a barca Liberal transformada pelo governo em navio de guerra. Assim é que, em 2 de junho,sob o comando do Tenente Joaquim Raimundo de Lamare, tomou juntamente com as canhoneiras Oceano e São Pedro, o passo de São Gonçalo, em frente à foz do arroio Pelotas, às forças revolucionárias comandadas pelo major João Manoel de Lima e Silva.”


FONTE: Boletim Informativo do Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, nº 2 – set/out/nov. de 1984. P. 5-7.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

CINE-HOTEL (2)

O novo empreendimento sonhado em Rio Pardo na década de 50 localizava-se no prédio da atual Prefeitura Municipal, à Rua Andrade Neves nº 324. Esta obra seria a concretização de um importante Centro Histórico Cultural do Estado, destacando Rio Pardo por sua originalidade histórica.
As obras estavam em pleno andamento, mas no final de 1957 começaram os problemas. Apesar de todos os esforços da Diretoria, inclusive com um empréstimo para que a obra não parasse totalmente, o saldo do capital subscrito não correspondia ao previsto. As consequências logo se fizeram sentir de forma desastrosa para a entidade.
Apesar dos apelos a todos membros do Consórcio, não houve resultado positivo para a continuação da obra. A Diretoria prestou contas do andamento dos trabalhos mas foi maior o desinteresse dos subscritos para o aumento do capital. Logo a Diretoria não tinha recursos suficientes, nem para o término da construção da parte térrea do edifício.  Em setembro de 1957 uma das salas térreas foi alugada à Companhia Rio-grandense de Adubos CRA.
Com a paralisação da construção do edifício não houve mais interesse por parte do público em investir capitais no Consórcio e retraiu ainda mais os subscritores, que já vinham pagando suas cotas com atraso.

REFERÊNCIAS: Coleção de Jornais do Arquivo Histórico Municipal - Jornal de Rio Pardo e Jornal a Folha - 1956-1958.