“UM PIONEIRO
A
recente publicação de “A arte de vinificar, de beber e de analisar vinhos”, de
autoria de Ernesto Cataluña Veses, patrocinada pela Companhia Vinícola
Rio-Grandense, ao ensejo de seu cinqüentenário, ocorrido a 5 de junho de 1979,
veio oferecer oportunidade a que se relembre o nome do introdutor da
viticultura no Rio Grande do Sul.
Não
sendo historiador, mas enologista, por sinal dos mais competentes, o autor
atribui a iniciativa da viticultura, entre nós, a Tomaz Master, que a teria implantado
na ilha dos Marinheiros, próxima à cidade de Rio Grande, em 1840. Sabe-se,
entretanto, que a produção de uvas e sua vinificação tiveram início em Rio
Pardo, antes mesmo de 1808, ano da chegada de D. João ao Brasil, quando só
então permitiu-se a instalação de “fábricas de qualquer gênero ou qualidade” na
antiga Colônia.
Nestas
condições, Rio Pardo não só foi o berço da viticultura, como também da
vinicultura no Rio Grande do Sul. E o nosso primeiro vitivinicultor chamava-se
Manoel de Macedo Brum da Silveira, um açoriano, natural da ilha do Pico. Além
de pioneiro nessa atividade e, posteriormente, grande estancieiro e fundador de
tradicional estirpe gaúcha, também foi o primeiro capitão-mor da Vila de Rio
Pardo.
As
referências históricas anteriores, dando notícias de que a parreira chegara ao
Rio Grande do Sul na bagagem das primeiras levas açorianas, ainda no século
XVIII, não retiram de Manoel de Macedo os méritos de seu pioneirismo, pois só
deram lugar a culturas que, além de destituídas de substância econômica, não
foram reconhecidas oficialmente, nem figuram na bibliografia conhecida sobre a
matéria, desde Gonçalves Chaves até Florêncio de Abreu.
As
atividades de Manoel de Macedo, como vitivinicultor, foram legalizadas através
de provisão baixada pelo então Príncipe Regente, a 11 de março de 1813. Nesse
documento se reconhece ter sido ele “o
primeiro a formar vinhas e fabricar vinho branco e tinto”, na Capitania do Rio
Grande de São Pedro. Afirma-se, ainda, no alvará que então lhe foi concedido,
que “não havia essa cultura” no território rio-grandense.
Por
sua vez, Antônio José Gonçalves Chaves, nas suas fundamentais “Memórias
Ecônomo-Políticas”, o primeiro livro sobre economia rio-grandense, publicado em
1822 e reeditado no ano passado por benemérita iniciativa da Companhia União de
Seguros Gerais, destaca a atuação de Manoel Macedo como pioneiro da cultura de
videiras e produção de vinho, mencionando a quantidade de barris em que o
produto era comercializado.
A
colocação de Rio Pardo como berço da vitivinicultura rio-grandense e a
contribuição de Manoel de Macedo nessa realização pioneira foram estabelecidas
pelo historiador Paulo Xavier, em pesquisa original, publicada na edição de 4
de julho de 1959 do Correio do Povo.
Aliás,
não se pode escrever a história econômica do nosso estado sem recorrer aos
trabalhos que Paulo Xavier vem divulgando, há alguns anos, notadamente no “Suplemento
Rural” daquele matutino. Elaborados sempre em cima da melhor documentação, em
geral recolhida dos arquivos em primeira mão, seria do maior interesse que
esses trabalhos fossem agrupados por assunto e publicados numa série de
volumes, pois constituem – convém repetir – subsídios indispensáveis para o
estudo da formação econômica rio-grandense, sobretudo no setor agropastoril,
sua industrialização e comercialização.
Como
ainda não se tomou iniciativa tão necessária quanto inadiável, Paulo Xavier
continua sendo um “autor sem livros”, conforme já tive ocasião de observar,
noutra oportunidade. A esta singularidade ele reúne a de ser o mais operoso e
fidedigno pesquisador da economia rural do Rio Grande do Sul. É dos poucos
historiadores que, em lugar de recorrer às fontes bibliográficas existentes,
vai diretamente aos documentos, inovando e enriquecendo o acervo da
historiografia rio-grandense, como o fez em relação ao primeiro capítulo da
história da vitivinicultura no Rio Grande do Sul, obra de um pioneiro da velha
colonização açoriana, é bom não esquecer.
(Setembro, 1979)”
FONTE:
REVERBEL, Carlos. Saudações aftosas. Porto Alegre:
Martins Livreiro, 1980. p. 31-2.
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