quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

DIVERSIDADE DO VALE DO RIO PARDO

Lissi Iria Bender Azambuja
Mestranda do programa de Mestrado em desenvolvimento Regional da UNISC

O desenvolvimento só faz sentido dentro de um embasamento histórico porque a história permite falar, entender as especificidades de cada região. E para entender a diversidade existente no Vale do Rio Pardo precisamos fazer uma revisão das causas históricas que promoveram essa realidade dentro de um contexto mais amplo – o Brasil.
O Brasil foi descoberto por portugueses em 1500 e por mais de três séculos durou seu domínio. O primeiro produto a despertar-lhe a atenção foi o pau-brasil, seguido pela cana-de-açúcar, o tabaco e o algodão. Mais tarde, a partir do século XVII, o interesse econômico centrou-se na extração de metais preciosos.
Nesse contexto, o Vale do Rio Pardo, inserido no Sul do País, sem deter atrativos econômicos imediatos, fica por mais de dois séculos à margem dos interesses portugueses.
A integração do Rio Grande do Sul às demais regiões se deu de forma subsidiária e dependente, em função do gado que havia sido introduzido anteriormente pelos jesuítas nas Missões. Com a retirada desses, o gado se reproduzia livre e solto (gado chimarrão), o que suscitou interesses e promoveu a instalação das primeiras estâncias, iniciando-se assim o processo de ocupação do espaço rio-grandense.
Para ocupar o território entre Laguna e Sacramento, que era acirradamente disputado entre castelhanos e luso-brasileiros, a coroa portuguesa começou nos anos 30 do século XVIII, a distribuir sesmarias a tropeiros sedentarizados e militares reformados.
Foi nesse contexto que teve origem Rio Pardo, com a edificação do Forte Jesus Maria José, em 1752, firmando-se como base militar, transformada em centro estratégico para os interesses expansionistas portugueses.
Em 1760 chegam os primeiros açorianos, fruto de uma tentativa portuguesa de colonizar o território. Mas esses chegam numa época turbulenta, de ruptura do tratado firmado entre espanhóis e portugueses, e os casais açorianos acabam dispersos pelo território, inclusive em Rio Pardo, onde se dedicam ao cultivo de trigo para exportação. Esse empreendimento foi responsável pelo desenvolvimento de Rio Pardo e promoveu sua importância econômica, destacando o município no cenário gaúcho da época. Essa trajetória foi interrompida a partir de 1820, quando os europeus resolveram sua crise na produção de cereais e deixaram de adquirir grãos produzidos pelos açorianos. Os açorianos voltam-se então para a produção extensiva de gado.
Rio Pardo, por sua localização privilegiada junto ao Rio Jacuí, era caminho natural em direção às missões e por isso fora eleita ponto estratégico pelas forças portuguesas para desocupar os missioneiros. E sua influência e importância foram também drasticamente reduzidas com a consolidação das fronteiras meridionais do Brasil em fins do século XVIII e princípio do século XIX. Assim, sem a especialização econômica do trigo, e com pecuária apenas extensiva em regime de latifúndio, Rio Pardo perde rapidamente espaço e influência, principalmente após a independência em 1822, quando o governo imperial se empenha para trazer ao Rio Grande trabalhadores europeus, preferencialmente alemães, que começam a chegar a partir de 1824.
Em 1848 o governo imperial delega às províncias maior participação no processo de povoamento do País. Desse modo o governo da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul funda a colônia de Santa Cruz e fomenta a vinda de alemães a partir de 1849. Esses vieram com suas famílias e aqui receberam pequenos lotes de terras com o compromisso de cultivá-los em regime familiar, sem utilizar mão de obra escrava.
É interessante observar que, entre as diversas etnias vindas ao Rio Grande do Sul, os alemães foram os únicos que não esperaram pelo governo para que seus filhos tivessem acesso à escola. Essa vinha antes mesmo da igreja e servia aos domingos para os ensinamentos do Senhor. O que reflete não somente o valor atribuído à educação, mas também um grande empenho na preservação de seu patrimônio cultural ameaçado pelas condições adversas a que foram submetidos.
Em seus pequenos lotes, os colonos dedicaram-se à policultura e não demorou para superarem a produção de subsistência. Principalmente o fumo e a banha, no início, alavancaram o desenvolvimento local. E assim, já em 1878, Santa Cruz tornou-se município, separando-se de Rio Pardo.
Foi portanto o êxito da produção colonial que suportou e fomentou o desenvolvimento da cidade, tanto comercial quanto industrial.
Em 1905 Santa Cruz já estava ligado a Porto Alegre por meio de uma estrada de ferro. Em 1906 já possuía rede elétrica. Também é dessa mesma época a instalação dos serviços de correio, de telefonia e de distribuição de água potável.
Diferentemente de Rio Pardo, Santa Cruz teve seu território dividido em pequenos lotes, ocupados por alemães, que trouxeram consigo uma cultura impregnada pela dedicação ao trabalho, pelo amor à terra, sem preconceitos em relação ao seu manuseio, justamente numa época em que fazia parte da tradição cultura escravista dominante no País a rejeição ao manuseio da terra, ao trabalho braças, por serem essas atividades consideradas menos dignas, legadas aos escravos até o final do século XIX.
Desse modo, com os imigrantes dedicando-se à cultura diversificada, inclusive de exportação, fomentando o comércio e a indústria, Santa Cruz Havia encontrado um caminho alternativo para o desenvolvimento, e pôde, desse modo, melhor inserir-se no contexto nacional, enquanto Rio Pardo manteve sua economia presa ao latifúndio.


Referência: AZAMBUJA, Lissi Iria Bender. Diversidade do Vale do Rio Pardo. Jornal Gazeta do Sul, Santa Cruz do Sul. 22 e 23 de abril de 2000, p. 4.

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